quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

A alimentação do Cascudo

A alimentação do Cascudo

INTRODUÇÃO
0 cascudo (Hypostomus sp) é tido como um peixe típico de águas continentais da América do Sul, habitando comumente águas correntes e de fundo pedregoso (Magalhães, 1931). O maior número das espécies do gênero Hypostomus está dividido em duas grandes partes, uma com o centro de distribuição na Região Amazônica e outra limitada, ao Leste da América do Sul, da Guiana Inglesa até o Uruguai (Gosline, 1945).
Os hábitos alimentares do cascudo foram estudados por Azevedo (1938), Angelescu e Gneri (1949), Zaret e Rand (1971), Soares (1978), Schroeder-Araujo (1980) e Nomura e Mueller (1983) em diversas regiões do Brasil, Rio Uruguai e Rio da Prata. Estes autores quase sempre se referem ao peixe como sendo iliófago ou herbívoro, alimentando-se principalmente de microalgas.
0 Lago Açu, onde nosso trabalho foi realizado, está localizado no "campus" da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (Itaguaí, R.J.). É um lago artificial construído em 1942, possuindo 80.000 metros quadrados de área, profundidade máxima de 3,5 metros e mínima de 0,3 metros nas margens (Silva, 1959).
Apesar de existir há bastante tempo, a ecologia desse lago tem sido pouco estudada. A primeira referência a ele foi dada por Kleerekoper (1944) acerca de algumas de suas características químicas e biológicas. O único trabalho sobre hábitos alimentares de peixes do lago foi realizado por Silva (1959), estudando o tucunaré (Cicla ocellaris, Bloch Schneider e C. temensis Humboldt). Entretanto, nenhum trabalho semelhante foi feito sobre o cascudo, apesar deste peixe ser de especial abundância no lago. Sabe-se apenas que alguns cascudos provenientes deste lago foram utilizados para estudos histoquímicos de sua mucosa digestivo-respiratória (Silva, 1967) sem que, contudo, fossem abordados aspectos de sua alimentação.
Em abril de 1982 foi dado início a um estudo sobre a bioecologia do Lago Açu. O projeto concentrou-se na reunião de informações ecológicas e biométricas das espécies ícticas, registrando-se também as condições abióticas do ambiente, afim de se determinar as influências que estas possam ter sobre a biologia das espécies ali existentes. O presente trabalho tem como objetivo mostrar os resultados obtidos durante o período de abril a outubro de 1982 acerca do regime alimentar dos cascudos capturados no lago.

METODOLOGIA
Mensalmente foram realizadas amostragens de peixes no Lago Açú da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (22047'S, 43O40' W), através de arrasto com rede de "tresmalho".
Todos os peixes coletados tiveram seu comprimento total medido (em metros) e foram pesados (em gramas), retirando-se uma subamostra para análise do conteúdo do tubo digestivo. Esta sub-amostra era constituída por 20 exemplares, exceto nos meses em que tal número não foi atingido nos arrastos.
As amostragens foram executadas no período de abril a outubro de 1982, sempre em um mesmo local do lago, tendo sido estudado um total de 117 peixes.
Os peixes amostrados foram transportados para o laboratório onde realizou-se sua biometria e dissecção, através de incisão longitudinal no abdômen, para retirada do tubo digestivo.
Os tubos digestivos foram medidos (m), pesados (g) e fixados em formol a 5%. Nestes tubos foram feitas análises do conteúdo descritos por Laevastu (1965)
As análises foram realizadas em microscópio (Olympus CH), utilizando-se o método de "Freqüência de Ocorrência" descrito por Hyslop (1980).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A relação entre o comprimento do tubo digestivo e o comprimento total de todos os peixes estudados é mostrada na Figura 1. Esta relação apesentou uma média de 24,67 ± 0,72, sendo Y = 0,79, para o limite de confiança de 95%. A mesma relação (24,6) foi acusada por Azevedo (1938) e não difere muito da média de 23,5 encontrada por Angelescu Gneri (1949) para cascudos em uma mesma faixa de idade. Alves e Albuquerque (1981) registraram uma média de 14,18 na relação comprimento total / comprimento do tubo digestivo dos cascudos por eles estudados, o que está bem abaixo da média obtida em nosso trabalho.
Na tabela I estão representados os organismos encontrados nos exames do conteúdo dos tubos digestivos e suas respectivas freqüências de ocorrência. Os resultados mostram a predominância de microalgas diatomáceas, clorofíceas e cianofíceas.
Alguns gêneros de microalgas se destacaram com freqüências elevadas durante todo o período de estudo. Entre as diatomáceas destacaram-se os gêneros Navicula, Pinnularia e Surirella. Entre as clorofíceas os destaques foram para os gêneros Pediastrum, Scenedesmus e Staurastrum. Com relação às cianofíceas, os principais gêneros foram Microcystis e Oscillatoria.
Além das microalgas, foi assinalada a presença de outros organismos como fitoflagelados, protozoários, rotíferos, nematódeos e artrópodos (crustáceos, insetos e ácaros), entretanto, apenas alguns destes organismos chegaram a atingir freqüências relativamente altas em certos períodos.

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A importância das algas na alimentação dos peixes estudados pode ser vista na figura 2, que mostra as variações nas freqüências de ocorrência dos diversos grupos de organismos encontrados nos tubos digestivos durante todo o período de estudo. Pode-se observar que apenas as algas ocorreram com freqüência de 100% em todas as amostragens, enquanto que os outros grupos se mostraram sujeitos a variações durante o período de estudo. Apesar de predominância das microalgas, o fato de terem sido encontrados muitos organismos animais no conteúdo dos tubos digestivos discorda do que afirma Azevedo (1938) sobre o cascudo alimentar-se exclusivamente de algas. Segundo a classificadção dada por Nikolsky (1963),o cascudo seria um peixe eurifágico (com vários itens alimentares), pela diversidade de alimentos que pode ingerir. Esta mesma classificação foi dada por Schroeder - Araújo (1980) aos cascudos da represa de Ponte Nova, SP. acrescentando que sua alimentação é, mais especificamente, detritívora - herbívora - fitoplanctófaga.
Os resultados obtidos em nosso trabalho parecem concordar mais com as observações de Angelescu e Gneri (1949), que deduziram ser o regime alimentar do cascudo dependente das características fisiogeográficas e biológicas de seu habitat, podendo ser ao mesmo tempo, um peixe omnívoro ou iliófago.

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Pesquisa de C. Dias Jr, L.M.Y Oshiro, R.M. Buchas (da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro) apresentada no III Simpósio Brasileiro de Aquicultura em São Carlos - SP - em 1984.

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